quarta-feira, 21 de março de 2012

O medo de amar

Meu filho,

No sábado de madrugada, numa pousada em Mário Campos, em um berço de almofadas delicioso que fiz para acolher a criança que fui, a mamãe se entregou ao medo de amar.

E esse medo, infelizmente, é um velho conhecido meu. É um sentimento que dói e machuca, que me paralisa, que me esgota. Mas, naquele dia, a mamãe se permitiu chorar e ‘chorou, chorou, chorou’ tal qual aquela música do passarinho na gaiola que você adora cantar. E a mamãe foi ficando assustada e o medo foi aumentando, aumentando, aumentando. E veio o medo de, com o meu choro,  acordar  as outras ‘crianças’ que dormiam suavemente naquele ‘Porto Seguro’.

E veio o medo de, com o meu choro doído, acordá-lo também. E o escuro da madrugada, e a solidão que tomava conta de tudo fez com que eu mergulhasse ainda mais naquele pavor que me abraçava. E o medo foi aumentando, aumentando tanto, que achei que iria morrer.

Quando supus que já tinha chegado no mais profundo do que o meu pânico permitia, uma ave de rapina cruzou o céu, bem baixinho e bem pertinho do berço que acolhia a mamãe na varanda daquela noite fria. E depois veio outra. E a mamãe, paralisada, não sabia se corria, se chorava ou se gritava. Apenas fui capaz de me encolher ainda mais, curvando-me à minha incerteza sobre o amor e na dor de perceber que, por medo, não em entrego plenamente à vida, às pessoas lindas que me rodeiam, ao amor e a você.

Isso porque na imaturidade da minha alma, por medo de que algo de ruim aconteça, por medo de te perder, por medo de não te merecer, ainda não sou capaz de me entregar plenamente ao amor, meu filho lindo.

E ao lado disso existe o medo de que, em algum movimento, eu perca o seu pai, e tem também o medo de perder seus avós, suas tias e tantas pessoas queridas. Medo de adoecer, de ficar dependente.  E medo de me entregar ao fluxo da vida. E a minha dificuldade de sentir a confiança de que tudo está certo, tudo no seu devido lugar, tudo no seu devido tempo. E finalmente os maiores medos  que são: o medo da vida e o medo da morte.

Aos poucos estou contando para minha alma insegura que não morremos de medo. Só  morremos se não formos capazes de amar plenamente a vida, as pessoas, a nós mesmos, pois como me ensinou a Carla Eboli,  o contrário do medo, meu filho,  não é a coragem, é o AMOR.

E quando o dia amanheceu trazendo luz para minha escuridão, ouvi seu chamado no berço do quarto: ‘oh mamãããe, mamãnheeeeee’   e, com ele, a alegria de estar viva e de poder aprimorar cada vez mais a minha forma de amar.

E fomos juntos tomar nosso café da manhã…

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No dia seguinte, quando chegamos em casa, contei o que vivenciei para a vovó Marilia e para o seu vovô Bill. Contei que, no meio do meu medo, tive coragem de observar com cuidado as duas aves que, aos gritos, expressavam aquele todo aquele pavor, ajudando-me a me curvar a ele  e descobri que tratava-se de duas corujas brancas.

O Vovô Bill, com sua paixão por aves, correu aos livros e da pesquisa resultou que se tratava da Barn Owl. Do outro lado do telefone, a vovó Marilia contou que referida coruja era linda e que as danadinhas que tanto me assustaram naquela noite abençoada tinham o rosto em formato de coração!!!!

Barn Owl  Barn Owl

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barn owl day

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E veja nesse link como era o som que fazia aquele casal de corujas ao cantar o meu medo de amar:

http://www.allaboutbirds.org/guide/Barn_Owl/sounds/nc

 E enquanto eu escrevia essas palavras, lembrei-me desta música do Beto Guedes

O Medo de Amar e o Medo de Ser Livre

O medo de amar é o medo de ser
Livre para o que der e vier
Livre para sempre estar onde o justo estiver

O medo de amar é o medo de ter
De a todo momento escolher
Com acerto e precisão a melhor direção

O sol levantou mais cedo e quis
Em nossa casa fechada entrar pra ficar

O medo de amar é não arriscar
Esperando que façam por nós
O que é nosso dever: recusar o poder

O sol levantou mais cedo e cegou
O medo nos olhos de quem foi ver
Tanta luz

E eu daqui, pegando carona na inspiração do compositor, escolho “recusar o poder (recusar a ilusão do controle). Escolho abrir-me totalmente para que o sol entre na minha “casa fechada” cegando o medo dos meus olhos que buscam toda essa luz.

sábado, 10 de março de 2012

No more drugs

Filhotinho querido,

De repente você começou a falar tudo. Tudinho mesmo. Está até cantando! Com isso acabaram-se as listas das novas palavras incorporadas ao seu vocabulário.

Um ano e oito meses foi um marco e, em todos os sentidos, definitivamente, você deixou de ser um bebezinho.

A mudança no seu comportamento, sua fala, a forma como faz graça para atrair olhares, risos e aplausos me fazem perguntar , já com saudade, aonde foi  parar aquela criança tão timida e tão grudada no papai e na mamãe. Ao mesmo tempo, meu peito não cabe de tanto orgulho. Vamos aprendendo juntos  a lidar com as mudanças, aprendendo a  nos  divertir, a descobrir novas brincadeiras e novas formas de nos comunicarmos e o resto vai se acomodando gentilmente na rotina diária.

Estou feliz também pela capacidade de ter, rapidamente,  desenvolvido uma técnica para impedir o início das birras. É claro que isso MUITAS vezes não dá certo, mas já estou aprimorando técnicas de abortar os momentos de crise  quando você não quer nada, nada mesmo. Em muitas situações você precisa apenas esgotar seu choro, e respeitamos isso de longe. Depois tudo fica bem novamente.

Sempre me falaram que cada fase tem seu charme e que tudo só vai melhorando. No entanto,  desde que você nasceu, meio cética, acabo achando que estamos vivenciando a melhor fase. Daí vem a  sensação de que essa tal melhor fase está se acabando, mas vem a Dona Realidade e começa outra etapa ainda melhor. 

Com isso vou seguindo muito feliz com a forma que vamos nos adaptando, nos moldando e aproveitando o que esses dias  belamente tem oferecido a nós.

De quebra estou MUITO feliz pelo fato de você ter sido, finalmente,  liberado pelo nefrologista do uso do antibiótico que vinha fazendo uso desde a maternidade. Yiiipiiii!

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sexta-feira, 2 de março de 2012

Realidade ou sonho?

Acabei de me lembrar de um post que escrevi mentalmente, durante as nossas férias na Bahia, quando ficamos uma semana interinha desplugados, longe do computador,  dos e-mails e do celular.

Foi mais ou menos assim: Na vila da Praia do Forte, que fica pertinho da pousada onde nos hospedamos, estava acontecendo um festival de Jazz e, no sábado, teve um show do Milton Nascimento.

Ao descobrir a programação do evento, de imediato,  tive a idéia de te levar para a muvuca e assistir o show descalça, com os pés na areia, o vento no rosto, você dormindo no meu colo ao barulho do mar  e da musicalidade mineira do Bituca. Nem preciso dizer que essa linda imagem onírica não se concretizou. 

Quando seu sono chegou, ficamos morrendo de dó de te expor àquele som alto do show de abertura, àquela ventania que estava mais para furacão do que para brisa do mar e voltamos para a pousada de onde, para nossa surpresa,  pudemos ouvir o show todinho deitados na rede da varanda do quarto, sentido o frescor do mar, olhando as estrelas e depois a chuva que caiu, enquanto você dormia aconchegado no berço. 

E o show foi bárbaro. ‘Canção da América’, ‘Ponta de areia’, ‘Coração de estudante’, ‘Travessia’, ‘Sentinela’, ‘Caçador de mim’, ‘Bola de meia, bola de gude’, ‘Maria Maria’.

Fiquei muito emocionada, sentindo a música me preencher,  e absorvendo toda aquela emoção não cabendo dentro de mim. Você alí, dormindo o sono dos justos e o seu pai ao meu lado, sentado na varanda, num daqueles momentos perfeitos da vida em que dá vontade de congelar  o tempo e registrar na memória e na alma para que nunca se apague e se esvaia.

É filhote, as vezes a realidade é mais linda do que o sonho…

E essa letra vai para você:

 

Caçador de Mim

Milton Nascimento

Por tanto amor
Por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz
Manso ou feroz
Eu caçador de mim

Preso a canções
Entregue a paixões
Que nunca tiveram fim
Vou me encontrar
Longe do meu lugar
Eu, caçador de mim

Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito a força, numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura

Longe se vai
Sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir
O que me faz sentir
Eu, caçador de mim